Pesquisador Eduardo Falabella aponta UCS como referência para rede de química sustentável.
Coordenador de Rede Brasileira de Química Verde, pesquisador da UFRJ e expert em biorrefinaria conheceu estrutura e pesquisas da Universidade em Biotecnologia e Engenharia Química e palestrou no IV Seminário de Tecnologia, Inovação e Desenvolvimento Social.
Reunir os sistemas de conhecimento – instituições de ensino superior, centros de pesquisa, órgãos públicos e entidades – do Estado em torno de uma Rede Gaúcha de Química Sustentável, tendo a Universidade de Caxias do Sul como centro. A finalidade: incentivar inovações no setor produtivo a partir do reaproveitamento de resíduos do agronegócio, gerando produtos com valor agregado e novas aplicações, aperfeiçoando processos industriais e instalando modelos alternativos de geração de energia.
A proposta surgiu após visitação do coordenador da Rede Brasileira de Química Verde, Eduardo Falabella Souza-Aguiar, a diversos setores da UCS nesta semana. Professor doutor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), dedicado à biorrefinaria desde a aposentadoria após 30 anos de atuação na Petrobras e consultor para Rotas Limpas e Tecnologias Verdes da Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial (UNIDO), entre outras atribuições, o especialista esteve na UCS para palestrar aos estudantes de Química, Engenharia Química, Engenharia Ambiental durante o IV Seminário de Tecnologia, Inovação e Desenvolvimento Social, promovido pela Área do Conhecimento de Ciências Exatas e Engenharias.
Equilíbrio social, econômico e ambiental – De acordo com Falabella, a atuação da rede poderia se iniciar pela prestação de serviços, por meio do oferecimento do conhecimento e da estrutura de laboratórios existentes nas universidades em projetos de interesse das empresas. Primeiramente, para o desenvolvimento de inovações incrementais (aquelas que melhoram algo já existente), e abrindo espaço para inovações disruptivas (mudança de paradigma que torna o anterior obsoleto) com a implantação de processos e produtos sustentáveis – ou seja, caracterizados pelo “balanceamento racional entre as forças sociais, ambientais e econômicas”, explica.
E para um modelo sustentável funcionar, alerta o professor, uma condição contextual é fundamental: uma cultura ligada ao empreendedorismo. “Aqui é uma região ideal, porque muitos aprenderam a empreender desde cedo por causa da agricultura familiar”, considera Falabella. Assim, a proposição tem potencial de gerar efeitos desde o início da cadeia de atuação, com o fortalecimento da agricultura, se estenderia pela melhoria dos processos produtivos, tornando-os mais ecológicos e criando produtos com valor agregado a partir dos resíduos e, ao final, ainda resolveria o problema do descarte, pelo aproveitamento integral da matéria-prima.
Alinhamento com TecnoUCS – Tal configuração encaixa-se no conceito de atuação do Parque de Ciência, Tecnologia e Inovação da Universidade, o TecnoUCS, que propõe exatamente a disponibilização da estrutura e transferência do conhecimento gerado na Universidade para o setor produtivo e o poder público, aperfeiçoando processos, produtos e serviços, gerando soluções de mercado, modernizando diversificando e ampliando a matriz econômica regional por meio da inovação.
A qualidade do parque foi atestada por Falabella, que laboratórios do Instituto de Biotecnologia e do curso de Engenharia Química. “Aqui temos um verdadeiro conceito de Universidade, com estruturas, pesquisas, pessoas com vontade de fazer e suporte da alta gestão. A UCS tem tudo para ser uma das grandes universidades do Brasil”, sentenciou.
Movimentos sustentáveis são os que simulam os processos naturais
Sustentabilidade é o alicerce do trabalho atualmente desenvolvido em nível mundial pelo professor Eduardo Falabella Souza-Aguiar. E ele se sustenta no conceito Triple Bottom Line, pelo qual os resultados das organizações são medidos pelo equilíbrio entre três eixos: econômico, social e ambiental. “A sustentabilidade está diretamente associada à ética. Tem a ver com querer manter o mundo para gerações futuras”, define o pesquisador. E, citando o filósofo alemão Nietzsche, para quem a ‘ética é a moral dos processos que podem se desenvolver à eternidade’, arremata a conceituação: “Assim, movimentos sustentáveis são os que simulam os processos da Terra, são aqueles que permanecem”
Por isso, meio escolhido por Falabella para trabalhar pela sustentabilidade é a biorrefinaria, pelo qual é buscada a obtenção de derivados da refinaria tradicional (de petróleo) a partir de resíduos do agronegócio (biomassa). “O produto final é igual ao obtido do refino do petróleo, mas os processos são mais ecológicos e ocorrem 100% a partir de reciclagem”, pontua o pesquisador.
É o que permite, por exemplo, a criação de uma indústria alcoolquímica alternativa à petroquímica, com o processamento da cana-de-açúcar. Além da fermentação para produção de etanol (álcool) e polietileno, resíduos como o bagaço e a palha da cana são fontes de carbono. Ou seja, da mesma matéria-prima resultam combustíveis, plásticos, borrachas e defensivos agrícolas, entre outros. Cascas de frutas e cereais, madeira, óleos vegetais e óleos essenciais, entre outros, são fonte de biomassa.

Tudo se transforma – O conceito se estende para o de biorrefinaria integrada, pelo qual os rejeitos dos bioprocessos também são reaproveitados. É o caso, ficando ainda no exemplo da cana-ade-açúcar, do bicarbonato de amônia gerado na produção de etanol, que pode ser usado na produção de fertilizantes para a própria cana, “simulando os processos terrestres, que são de eterna reciclagem”, ilustra o professor.
A modalidade está alinhada com o conceito da Economia Circular, modelo que integra os processos industriais com o princípio da economia atômica – pelo qual é buscado o aproveitamento mais completo possível dos átomos da matéria-prima. Trata-se da aplicação plena do princípio sintetizado no enunciado mais famoso do ‘pai da química moderna’, o francês Lavoisier: ‘Na natureza nada se perde, tudo se transforma’,
É o caso de trabalhos desenvolvidos na UCS como as pesquisas sobre biogás conduzidas no Laboratório de Energia e Bioprocessos, coordenado pelo professor Marcelo Godinho, capazes de gerar biocombustíveis e energia térmica, ou as pesquisas para a transformação do glicerol, obtido como subproduto da produção de biodiesel, do Laboratório de Biotecnologia de Produtos Naturais e Sintéticos, coordenadas pelo professor Thiago Barcellos.
Nesse caso, explica Barcellos, um dos subprodutos é o glicerol, uma fonte de carbono versátil, pela qual se pode produzir moléculas de grande uso para a indústria química, como o ácido lático, visando à fabricação de polímeros e medicamentos. A conversão do glicerol em ácido polilático, por sua vez, gera um polímero biodegradável com várias aplicações – desde a produção de copos e garrafas plásticas e carretéis de impressora 3D até cosméticos, próteses e bioimplantes.
Fotos: Claudia Velho